23 de outubro de 2009

Maestro Gaó

Odmar do Amaral Gurgel, conhecido artisticamente como Maestro Gaó, foi regente, pianista, radialista e compositor musical durante mais de sete décadas. Saltense nascido em 12 de fevereiro de 1909, era filho de Joanna e Acylino do Amaral Gurgel, ambos professores e músicos em Salto. Tendo no lar as influências primordiais, já aos cinco anos Gaó estava alfabetizado e começava a estudar música. Era aluno do 1º Grupo Escolar de Salto, do qual seu pai chegou a ser diretor. Aos onze anos, o futuro maestro renomado já participava de uma orquestra de salão, da qual se tornou o regente com apenas 11 anos. À noite, em Salto, o trabalho do jovem Gaó era ir ao Cine Pavilhão para selecionar as músicas da orquestra, da qual seu pai era clarinetista, adaptando-as às diversas cenas dos filmes mudos daqueles tempos. Certa vez, o jornal carioca Correio da Manhã, em texto de Carlos Lacerda, publicou sobre Gaó, após uma brilhante apresentação sua: “A Sinfonia do Brasil, que procura exprimir na variedade dos motivos, a grandeza do Brasil através da arte, encontrou o seu animador. Por pitoresca coincidência nesse espetáculo de exaltação ao esforço e valor do povo brasileiro, o criador de beleza foi um rapaz de Salto do Itú [sic], que aprendeu piano em casa com seus pais, professores públicos, e constitui uma lição de valor e de esforço próprios, lição aos músicos e a toda gente.”


Família do Maestro Gaó. São os pais: Acylino e Joanna. Os filhos (da esquerda para a direita): Ayr, Grafir, Oisb, Walkyr e Odmar (Gaó), c.1920.

Em 1920 Gaó compôs sua primeira música, uma mazurca, e a batizou "Primeira inspiração". As seguintes foram "O cantor sincero" e "Myosotis", oferecida à sua mãe. Buscando desenvolver seu talento, foi para São Paulo, tendo como primeiro professor o pianista Samuel Arcanjo dos Santos, responsável por sua preparação para o ingresso no Conservatório Dramático e Musical de São Paulo. Nesses cinco primeiros anos na capital, residiu numa pensão – onde conheceu sua futura esposa, que era filha do proprietário – e foi empregado de uma loja de música, a Casa Di Franco. No citado conservatório teve como professores Mário Andrade, Carlos Paglucci e Savino de Beneditis. Enquanto estudava, Gaó sobrevivia toando na Jazz Band Manon e na Casa Di Franco, o que lhe propiciou o contato com renomados músicos da época, tais como Tupinambá, Eduardo Santo e Ernesto Nazareth. Assim, diplomou-se concertista em 1927.

Até 1924 assinou suas músicas com suas iniciais: O.A.G., mas aconselhado por um amigo, nessa data, inverteu-as, passando a se chamar artisticamente Gaó. Nessa mesma década atuou na rádio Educadora Paulista - pouco tempo depois rebatizada como rádio Gazeta - onde dirigiu um quarteto de cordas. Atuou também na rádio Cruzeiro do Sul. Por essa época, tornou-se exclusivo da gravadora de discos Colúmbia, da qual chegou a ser diretor, contexto no qual surgiu seu primeiro quarteto de jazz. Como solista da Orquesta Colbaz, por ele criada, obteve destaque com as músicas "Branca", "Tico-tico no fubá" (ambas composições de Zequinha de Abreu) e com os discos "Gaó, seu piano e sua orquestra", "Gaó bem brasileiro" e "Gaó viaja pelo mundo". Teve participações na sonorização de filmes, especialmente na Atlântida. Dirigiu as rádios Cruzeiro do Sul e Cosmo e criou programas de sucesso, como "Hora da saudade" e "Hora dos calouros". Compôs logotons para programas famosos à época. Já no final da década de 1930 Gaó era figura de relevo no cenário artístico paulistano.


Gaó ao piano, na rádio Cruzeiro do Sul, década de 1930.

Sua ida para o Rio de Janeiro, para trabalhar nas rádios Ipanema e Mauá, foi seguida de um curto período em solo argentino, na rádio Belgrano, com posterior retorno ao Rio, quanto a rádio Nacional o contratou. Ainda na então capital federal, Gaó trabalhou no Cassino da Urca, tendo participado de festas de figuras eminentes do cenário nacional. Esteve também à frente da Orquestra Sinfônica do Teatro Municipal de São Paulo, por curto período, e na direção da rádio Globo carioca. Em 1945 Gaó foi para os Estados Unidos, lá permanecendo por duas décadas, sendo tratado por “embaixador do samba”. Apresentou-se algumas vezes, inclusive, ao lado de Carmem Miranda. Por esses anos, ainda mantinha contato com seus conterrâneos saltenses. Suas cartas eram muitas vezes publicadas nos jornais locais. De volta ao Brasil, radicou-se em Mogi das Cruzes, onde faleceria em setembro de 1992. Muito bem acolhido nessa cidade, a escritora mogiana Botyra Camorim escreveu uma biografia sobre Gaó, intitulada Sonata em quadro movimentos. Gaó também publicou um livro, Teoria moderna de música, ao completar o jubileu de ouro de sua carreira. A última homenagem a ele prestada ainda em vida, em Salto, deu-se em dezembro de 1988, quando da inauguração de um auditório levando seu nome, anexo ao Conservatório Municipal. Nesse espaço, Gaó se apresentou pela última vez na terra natal, em 1991, no evento que foi chamado de “Noite da gratidão”.

Nota: As músicas de cada um dos personagens da Turma da Mônica, criados por Maurício de Sousa, são composições do Maestro Gaó. Você pode ouvi-las no site: http://www.monica.com.br/musicas/midi/welcome.htm

Dados artísticos de Gaó no Dicionário Cravo Albin da Música Popular Brasileira: Iniciou a carreira radiofônica em 1926, quando ingressou na Rádio Educadora Paulista. Em 1930, formou e passou a dirigir a orquestra Colbaz que gravou uma série de discos na Columbia incluindo os primeiros registros dos choros "Os pintinhos no terreiro"e "Tico-tico no fubá", e da valsa "Branca", de Zequinha de Abreu. Em 1931, contratado pela gravadora Columbia, registrou como pianista as canções "Jaci", "Saudades", e "Ilusão que se vai", as três de Jaime Redondo, e o fox-trot "Nola", de Felix Arndt. No mesmo ano, seus choros "Arreliento" e "Suspirando" foram gravados na Columbia pela Orquestra Colbaz sob sua direção. Ainda em 1931, gravou ao piano pela Columbia os fox-trot "My syncopated girl", de sua autoria, e "All of a twist", de Billy Mayerl, e os choros "Quando o banjo toca" e "Teimoso", de sua autoria. Entre 1932 e 1936, atuou nas Rádios Cruzeiro do Sul e Cosmos, em São Paulo, veio depois para o Rio de Janeiro e atuou nas Rádios Nacional e Ipanema. Ainda em 1932, teve a marcha "Marcha Caloric" gravada pela Orquestra Caloric na Columbia. Em 1934, sua valsa "Você é minha felicidade" foi gravada pela Orquestra de Salão Columbia, e o fox-trot "Silhueta" foi registrado pelo instrumentista Jonas ao saxofone. Em 1935, criou uma orquestra de dança com a qual gravou na Columbia os fox-trot "Há cha cha", de Werner e Hahn, e "June in january", de Robin e Rainger. No mesmo ano, gravou ao piano a "Rapsódia mal começada" partes I e II com arranjos seus sobre temas de Schubert. Em 1937, gravou ao piano com Ernesto Trepeccioni ao violino a toada "Araponga" e a lenda brasileira "Aparição de iara", ambas de Marcelo Tupinambá. Nesse ano, formou a Gaó, sua nova orquestra e coro com a qual acompanhou a gravação das marchas "Gauchinha" e "Já tirei o meu chapéu", ambas de Lamartine Babo, a primeira nas vozes de Lamartine Babo e Sílvio Alcântara, e a segunda nas vozes de Lamartine Babo e Silvino Neto. Nesse ano, acompanhou mais algumas gravações na Columbia: Cândido Botelho na canção "Eu amo todas as mulheres", de Robert Stoll e Cândido Botelho, e na rumba "Marinella", de Roger, Scotto e Cândido Botelho, Lais Marival no maracatu "Meu ganzá" e no samba-canção "Saudades do morro", ambas de H. Celso e A. Santos, e Raul Torres, no samba-canção "Mentira", de Fernando Lobo e Capiba, e no frevo-canção "Mauricéia", de Marambá e Aníbal Portela. Em 1938, acompanhou com sua orquestra o cantor Jorge Fernandes na gravação da canção "Adeus da Bahia", de Nelson Vaz, do motivo popular "Meu limão, meu limoeiro", com arranjos seus, no samba "Caboclo feliz", de sua autoria e Luiz Peixoto, na canção "Moreninha", de Georgina de Melo, no maracatu "Senzala", de Durval Borges e José Carlos Burle, e na "Ladainha", de Cassiano Ricardo e Armando Fernandes, e a cantora Silvinha Melo nos fox "Soldadinho de chumbo", de Marcelo Tupinambá e Galda de Paiva, e "Quando cantas "to you", de Joubert de Carvalho. Em 1939, gravou ao piano com o grupo Gaó e Seu Ritmo as marchas "Pirulito", de João de Barro e Alberto Ribeiro, "Joujoux e balangandans", de Lamartine Babo, e "Eu não te dou a chupeta", de Silvino Neto e Plínio Bretas, todas em ritmo de fox, e o fox-trot "Canaries serenade", de Billy Mayerl. No começo da década de 1940, passou a trabalhar. na gravadora Odeon. Antes porém, ainda dirigindo a orquestra Columbia acompanhou Zilá Fonseca na gravação das marchas "A charanga do Oskar", de Aloísio Silva Araújo, Francisco Malfitano e Geraldo Mendonça, "Sonho de uma noite de verão", de Aloísio Silva Araújo e Francisco Malfitano, "Pulga maldita", de motivos populares com arranjos de Francisco Malfitano, e "Pigmaleão", de Frazão e Francisco Malfitano. Em 1944, acompanhou com sua orquestra na Odeon o Trio de Ouro na gravação da fantasia "O fantasma dos povos", de Herivelto Martins e Aldo Cabral, em duas partes, e a cantora Odete Amaral no samba "Casa sem número", de Laurindo de Almeida e Dias da Cruz, e no choro "Mais devagar coração", de Gastão Viana e Mário Rossi. Nessea época, dirigiu a orquestra do Cassino da Urca. Em 1945, acompanhou com sua orquestra do Cassino da Urca o cantor Léo Albano na gravação da valsa "Ao cair de uma estrela" e no samba "Cabrochinha", ambas de Laurindo de Almeida e Edgard de Almeida, e a cantora Heleninha Costa no choro "Amor", de Laurindo de Almeida e Valdemar de Abreu, e no samba "Você é tudo que eu sonhei", de Laurindo de Almeida e Del Loro, dessa vez com seu sexteto, gravações efetuadas na Continental. Nesse ano, viajou para os Estados Unidos onde permaneceu por seis anos. Em 1946, voltou por breve tempo e acompanhou com sua orquestra de concertos na Victor o cantor Gilberto Milfont na gravação das canções "Geremoabo" e "Maringá", de Joubert de Carvalho. Na década de 1950 foi contratado pelas Organizações Victor Costa atuando com sucesso na Rádio Record. Em 1954, atuou no programa "Quando os maestros se encontram" da Rádio Nacional do Rio de Janeiro. Nesse ano, acompanhou com sua orquestra na Odeon a cantora Norma Ardanuy na gravação do samba "São Paulo de Anchieta", de Vanda Ardanuy, e na toada "Rabicho", de Marcelo Tupinambá, e a cantora Hebe Camargo na gravação dos sambas "Vou pra Paris", de Antônio Maria e Fernando Lobo, e "Aconteceu em São Paulo", de Antônio Maria, no fado "Tudo isso é fado", de Fernando Carvalho e Aníbal Nazareth, e no bailarico "Festa portuguesa", de Antonio Rago e Mário Vieira. Em 1955, acompanhou noovamente a cantora Hebe Camargo com sua orquestra na gravação do fox "Johnny Guitar", de Victor Young em versão de Júlio Nagib, e na canção "O que eu queria dizer ao teu ouvido", de Hekel Tavares e Mendonça Junior. Em 1960, gravou com sua orquestra pela Odeon o LP "Gaó viaja pelo mundo" numa viagem através de composições de várias partes do mundo no qual foram interpretadas as músicas "Brasileirinho", de Waldir Azevedo, "Asunción", de F. Riera, "Mi Buenos Aires querido", de Carlos Gardel e Alfredo Le Pera, "Jamaican rumba", de A. Benjamin, "Port-au-prince", de B. Wayne, "Havana special", de O'Farril, "Malagueña", de Ernesto Lecuona, "Coimbra", de Raul Ferrão e José Galhardo, "Sous le ciel de Paris", de H. Giraud, "Arrivederci Roma", de R. Rascel, Garinel e Giovanini, "Wien du stalt meiner traeume", de R. Sieozynski, e "Manhattan", de Rodgers e Hart. Gravou em 1964, pela Odeon, o LP "Gaó, seu piano e orquestra" no qual interpretou músicas de sua autoria como "Diamante azul", "Mimoso", e "Minha garota sincopada", além de clássicos da música popular brasileira como "Odeon", de Ernesto Nazareth, e "Samba em prelúdio", de Baden Powell e Vinicius de Moraes. Dois anos depois, lançou pela London/Odeon o LP "The melodic sound of Gaó's piano and The Ipanema strings" interpretando onze clássicos da música popular brasileria: "Murmurando", de Mário Rossi e Fon-Fon, "Curare", de Bororó, "Apanhei-te cavaquinho", de Ernesto Nazareth, "Flor de abacate", de Alvaro Sandin, "Naquele tempo", de Pixinguinha e Benedito Lacerda, "Da cor do pecado", de Bororó, "Ai yoyo (Linda flor)", de Henrique Vogeler e Luiz Peixoto, "Saudade", de Lauro Miranda, "André de sapato novo", de André Victor Correia, "Carinhoso", de Pixinguinha e João de Barro, e "Tenebroso", de Ernesto Nazareth, além do choro "Cabeludo", de sua autoria. Em 1967, gravou doze valsas brasileiras clássicas também pela London/Odeon no LP "Valsas brasileiras" no qual interpretou "Expansiva" e "Coração que sente", de Ernesto Nazareth, "Última inspiração", de Peterpan, "Aurora", de Zequinha de Abreu e Salvador J. de Morais, "Saudade de Iguape", de João Batista do Nascimento, "Só pelo amor vale a vida", de Zequinha de Abreu, "Saudades de Ouro Preto", de Antenógenes Silva, "Velho realejo", de Custódio Mesquita e Sady Cabral, "Boa noite amor", de José Maria de Abreu e Francisco Matoso, "Clube XV", de Oscar A. Ferreira, "Longe dos olhos", de Zequinha de Abreu e Salvador J. de Morais, e "Mimi", de Uriel Lourival. Em 1969, gravou o LP "Bem brasileiro" no qual interpretou de sua autoria as músicas "Paquerando" e "Mini-saia", e os clássicos "Brasileirinho", de Waldir Azevedo, "Garoto" e " Zênite", de Ernesto Nazareth, "Tico-tico no fubá", de Zequinha de Abreu, "Atraente", de Chiquinha Gonzaga, "Choro Nº 1", de Villa-Lobos, "No rancho fundo", de Ary Barroso e Lamartine Babo, "Um baile em Catumbi", de Eduardo Souto, e "Chuá chuá", de Pedro de Sá Pereira e Ari Pavão. Nesse ano, sua composição "Paisagem tropical" foi gravada por Osni Silva no LP "Mais uma noite".


Discografia de Gaó:

Jaci/Saudades/Ilusão que se vai/Nola
(1931) Columbia 78

My syncopated girl/All of a twist
(1931) Columbia 78

Quando o banjo toca/Teimoso
(1931) Columbia 78

Há cha cha/June in january
(1935) Columbia 78

Rapsódia mal começada (I)/Rapsódia mal começada (II)
(1935) Columbia 78

Pirulito/Canaries serenade
(1939) Columbia 78

Joujoux e balangandnas/Eu não te dou a chupeta
(1939) Columbia 78

Gaó viaja pelo mundo
(1960) Odeon LP

Gaó, seu piano e orquestra
(1964) Odeon LP

The melodic sound of Gaó's piano and The Ipanema strings
(1966) London/Odeon LP

Valsas brasileiras
(1967) London/Odeon LP

Bem brasileiro
(1969) London/Odeon LP

Um comentário:

Anônimo disse...

Fui aluna do Maestro Gaó em Mogi das Cruzes. Ainda estudo piano, agora em Sâo Paulo na ULM. GOstei muito de encotrar a biografia do Maestro na net! Tatiana Batalha

Ouça o hino da cidade, "Salto Canção", na gravação de 1966