22 de janeiro de 2012

Brasital

Por volta do ano de 1870, enquanto o café reinava no oeste paulista, na região ituana as culturas que predominavam eram a cana-de-açúcar e o algodão. Nessa época, o então povoado do Salto de Ytu tinha como seu grande atrativo a cachoeira. Assim sendo, para cá se dirigiam inúmeros visitantes. Em 1873, chegou a ferrovia, dando o impulso decisivo para que a cidade fabril surgisse.

Nas proximidades da cachoeira, na margem direita do rio Tietê, surgiram as duas tecelagens pioneiras, instaladas pelos industriais José Galvão (1875) e Barros Júnior (1882), que se aproveitavam do potencial do rio e empregavam turbinas hidráulicas para a geração de força motriz. Além de atrair trabalhadores para cá, as fábricas direcionavam a própria urbanização através dos melhoramentos executados em seus arredores. Vivia-se um despertar.

Salto se transformou numa localidade voltada para o trabalho. Em geral, a mão-de-obra dessas primeiras fábricas era formada pelo trabalhador livre brasileiro, com numerosa presença de mulheres e crianças, como se pode ver nas fotos dos grupos de operários desse período. No final do século XIX, a composição desse quadro inicial se alterou com a chegada de imigrantes europeus, em sua maioria italianos. Este grupo, presente em grande número em Salto, constituía a maioria dos operários empregados, que em muitos casos eram egressos de fazendas de café do interior paulista. Foram os descendentes desses primeiros italianos que formaram o contingente de trabalhadores das décadas seguintes.

Através de sucessivas fusões que incorporaram as primeiras tecelagens e a Fábrica de Papel Paulista, a partir de 1904 a Sociedade Ítalo-Americana tornou-se única proprietária do conjunto fabril. Em 1919, com uma mudança de acionistas, passou a se chamar Brasital.

A Brasital S/A, formada com capital brasileiro e italiano, marcou território e época, dominando parte da vida da cidade até por volta dos anos 1950. Construiu vilas operárias, instalou armazém, açougue, creche e escola. Quase sempre em expansão, era o destino de muitos filhos de operários, já que a política de contratação privilegiava os familiares de funcionários. Isso se concretizava por volta dos 14 anos de idade, em especial para as mulheres.

Era marcante a presença feminina, representando, por volta de 1940, 75% da mão-de-obra empregada. A elas invariavelmente cabia uma dupla jornada, tendo que conciliar os afazeres domésticos, nos períodos de folga, com o trabalho na fábrica. Os 25% restantes eram homens que trabalhavam na tinturaria, oficinas mecânica, elétrica e de carpintaria, nos escritórios, nas cardas e nos depósitos de algodão e de fios.

As meninas ingressavam como auxiliares das maquinistas, tanto na fiação como na tecelagem. Os meninos ingressavam como ajudantes dos mecânicos, eletricistas e carpinteiros. Outros ingressavam no escritório da fábrica ou como escriturários nas seções da indústria – tais como tecelagem, fiação, tinturaria e oficinas.

A denominação Brasital persistiu até 1981, quando o Grupo Santista a adquiriu. A fábrica existiu até 1995, momento em que a então Alpargatas Santista encerrou suas atividades em Salto. Atualmente, os prédios da antiga tecelagem abrigam um centro universitário.

Fábrica e rio - A relação dos operários com o rio sempre foi muito estreita. Existiam lendas sobre uma canoa fantasma que era vista nas águas do Tietê através das janelas da fábrica, pelos funcionários do turno da noite. Outro exemplo é a cena comum, até a década de 1950, de operários que saíam do serviço às 16h30 e atravessavam a Ponte Pênsil para ir pescar. Quase sempre havia um parente ou amigo esperando com as varas e as iscas. Ao escurecer, retornavam para suas casas com os peixes, que constituíam a mistura do almoço ou jantar do dia seguinte.


Operários da Brasital com o prédio da fiação ao fundo, c. 1920.


Ouça o hino da cidade, "Salto Canção", na gravação de 1966